Novembro chegou. E para os noruegueses, isso significa que chegou o mês mais difícil do ano. Sempre que eu falo que eu sou brasileira, a pergunta mais comum é: já conhece o inverno norueguês? Minha resposta é que sim, pois já passei três meses aqui esse ano, de fevereiro a abril. Vi muita neve e peguei -23 graus. Isso é conhecer o inverno, não é? Sim, isso é conhecer uma parte dele, mas eu ainda não havia conhecido a outra parte: o inverno sem neve e a escuridão típica do mês de novembro. E agora, depois de quase 15 dias conhecendo esse lado mais negro do inverno, posso ter certeza de uma coisa: a falta de sol é muito pior do que as temperaturas baixas.
Eu já tinha ouvido Léo fazer essa mesma avaliação, mas confesso que sem viver a experiência, eu não conseguia entendê-la muito bem. Era difícil imaginar que existia algo pior do que uma temperatura de -20. Acho que no fundo é difícil para uma pernambucana, abençoada com temperaturas elevadas e muito Sol durante quase todo ano, entender o impacto da falta de luz solar. Sabe aquele clichê "a gente só dá valor quando perde"? Aplica-se perfeitamente nesse caso. Nunca valorizei tanto o Sol como agora.
Ok, mas o que mudou na minha vida com a danada dessa escuridão? Acho que primeiro de tudo, o fato de eu estar vivenciando pela primeira vez a mudança do outono para o inverno me fez sentir mais a diferença de uma estação para outra. Ao mesmo tempo em que a mudança é mais gradual, e teoricamente mais fácil, você também passa a ter mais clareza das mudanças que estão ocorrendo. Vou tentar listar algumas delas com algumas estratégias que estou tentando utilizar para vencer os impactos dos dias curtos com baixa luminosidade:
1) Dificuldade para acordar. Como o Sol só começa a aparecer depois das 08h da manhã (e vai piorar ao longo dos próximos meses), meu ritmo biológico simplesmente não conseguia acompanhar o relógio. Acho que meu cérebro processava: "oxe, ta de noite, por que eu vou acordar?". Acho que não usei nenhuma estratégia específica para vencer essa dificuldade: foi na marra e na prática. Posso até dizer que essa primeira dificuldade foi praticamente superada: meu corpo começou a entender que eu não posso esperar pela luz pra ele começar a trabalhar, o que eu já considero um grande avanço pra essa pernambucana há 29 anos acostumada a acordar com o Sol, mesmo quando eu acordava às 05:30 da manhã.
2) Cansaço constante. Essas têm sido as queixas mais comuns: falta de energia e sensação de cansaço físico. Não, não é gripe. É carência de Sol. Às vezes acho que sou uma planta tentando inutilmente fazer uma fotossíntese. Esse cansaço se reflete nas tarefas diárias como um todo: falta de disposição pra sair de casa, pra trabalhar, pra cozinhar. Vontade de hibernar. E aqui é onde mora um dos grandes perigos do inverno: o risco de se entrar num processo depressivo. Não é à toa que a Noruega tem altos índices de suicídio e depressão sazonal. Calma que eu não estou nesse nível não, e a principal estratégia que eu tenho utilizado é me esforçar ao máximo para sair de casa, nem que seja dar uma volta no quarteirão, tomar uma café na esquina. Também tenho comido muito doce (essa parte não é ruim) e vou entrar na academia próxima semana. Realizar atividade física é essencial pra energizar o corpo.
3) Dores no corpo. Conversando com os noruegueses e relembrando as aulas de biologia, esse sintoma é efeito direto da falta de Vitamina D. Sem Sol, pouca produção de Vitamina D, baixa absorção de cálcio. O corpo dói, o cansaço aumenta, você fica em casa e o ciclo recomeça. Novamente, tentar aproveitar cada minuto de Sol é essencial. Uma amiga dinamarquesa me aconselhou a dar uma volta na rua depois do almoço e eu tenho tentado fazer isso. O problema é que, além dos dias curtos, os dias estão nublados. Então, quando supostamente haveria Sol (entre 08:30 e 16:00), ele de fato não está lá. O jeito vai ser repor a Vitamina D de uma forma mais artificial. A dica que recebi foi tomar Ômega 3 e eu já estou providenciando isso. Uma prática também comum aqui é frequentar os bronzeamentos artificiais, não apenas pra pegar uma cor, mas pra receber uma luz. Como bronzeamento, funciona, pois é muito comum aqui ver mulheres com as peles em tons laranjas. Suponho que deva funcionar pra Vitamina D também, mas esse negócio de ficar laranja não é comigo não, acho que prefiro o ômega 3.
4) Baixo rendimento no trabalho. Essa dificuldade, embora seja algo sentido pela maioria das pessoas, acho que me afeta de uma maneira especial pois eu sempre tive dificuldade de trabalhar à noite. Meu melhor horário de produção sempre foi pela manhã e eu tendia a ficar mais lenta quando escurecia. Conclusão: estou ficando lenta às 15:30 da tarde. A luz vai embora, meu cérebro pára e meu estômago diz que é hora de jantar. Resumindo, estou num processo de ensinar aos dois que não é hora de parar e não é hora de comer. A principal estratégia tem sido comer doce nessa hora. Não sei se eu estou criando uma desculpa pra comer doce, mas tem funcionado. Outra estratégia tem sido mudar o ambiente de trabalho ou acender velas. No caso da primeira, tenho criado o costume de sair da minha sala, onde eu trabalho sozinha, e ir para a biblioteca, onde existem mais pessoas trabalhando. Acho que é uma forma de dizer pro meu cérebro: "olha aí, não é hora de parar". Tem funcionando também.
Certo, mas só novembro tem os dias curtos? Por que ele é o pior? Os dias curtos continuam nos próximos meses do inverno, mas em dezembro a decoração de natal ajuda a deixar a cidade mais iluminada, e a chegada da neve quebra um pouco os tons cinzas do mês de novembro. Definitivamente, estou ansiosa pela chegada de dezembro!
Acho que o processo adaptativo é lento e difícil, mas acho que estou tendo alguns progressos. Sem dúvida, a escuridão e o inverno são dois aspectos negativos da Noruega e um desafio grande para quem vem de países como o Brasil. Mas ter a experiência de morar fora envolve exatamente aprendizagem sobre o novo país em que moramos e nosso país de origem. Isto significa reconhecer o que o nosso país ainda tem a melhorar e também o que o nosso país tem de bom. E sem dúvida, no quesito clima, nosso Brasil é literalmente iluminado!
Caramba, mesma coisa aqui... e o pior: garganta doendo! :(
ReplyDeleteSaudade de vocês!!!! Vamos marcar algo nessa semana?
Oi, Francis! Saudades também. Bora amanhã no filme do Senna? Beijos
ReplyDeleteOi Karine
ReplyDeleteAdoro ler sua forma de escrever suas experiências!!! Fique com o Omega 3, é mais saudável e preventivo. Solarium não compensa a falta de vitamina D! E quando a neve chegar ajuda bastante ;-) fica mais claro, e apesar do frio é bonito. Existem tb "lampadas terapeuticas" e um despertador que tb ajuda (posso te mostrar na loja, pertinho do GEEAK)Bjs Sania
Oi, Sania! Obrigada pela dica :)Vou querer conhecer essa lâmpada. E que bom que você gosta de ler minhas experiências aqui no blog. E eu gosto de ouvir suas experiências e dicas de quem já tem muitos anos de estrada na Noruega :)Apareça sempre aqui. Beijos!
ReplyDeleteSabe Karine, eu estou achando esse ano bem diferente dos outros dois. Está lenta a mudança. No ano passado, nevou em outubro! Então mal acabou o verão e esfriou de repente. Estou gostando dessa transição mais lenta sabe. Isso lembra o friozinho do Paraná, bem mais ameno que o daqui ;)
ReplyDeletebeijo
Sei como é esse processo: o dia que anoitece com a rapidez que nosso corpo não processa com exatidão. Morei em Amsterdam por muitos anos. Eu ficava muito tempo na biblioteca, pois em casa me deprimia e não conseguia estudar.
ReplyDeleteA maior experiência de viver em outra cultura, é valorizar o que há de melhor na nossa e a que estamos vivendo, sem dúvida. E, de presente, nos leva a um estado de auto-conhecimento e superação.
Gosto tanto de passar aqui e ver a beleza na sua escrita! Foi uma boa dica de blog da nossa amiga Cíntia!
Receba abraços aquecidos de sol. Bom inverno para vocês!
Cintia, na verdade acho que é a minha primeira experiência em ver a mudança da estação e parece que você sente mais, do que quando chega do Brasil direto pra neve (até pq tem toda a novidade). Mas eu estou melhorando...
ReplyDeleteLoves make a family (qual o teu nome?:)) Estou realmente notando que ir pra biblioteca está fazendo toda a diferença mesmo. Muito obrigada pelos seus comentários. Volte sempre! Já já tem post novo... Beijos!